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quinta-feira, 21 de março de 2013

Consciência, misericórdia e julgamento



Maria Emmir Oquendo Nogueira

Faz algum tempo que tenho “matutado” sobre a consciência e sobre o velho e utilíssimo “exame de consciência”. A bem da verdade, ainda não consigo me satisfazer com a expressão mais moderna: “revisão de vida”. Para mim, revisão de vida remete mais a atos exteriores, a pecados que fazemos, enquanto o exame de consciência diz mais respeito àquilo que temos enraizado em nós e é a fonte de todo pecado. Como Davi canta no salmo 50 “minha mãe me concebeu na culpa, à minha frente está sempre o meu pecado”.


Quando medito sobre o sentido da palavra “consciência” do ponto de vista da antropologia teológica, que ensina ser a consciência aquela área na qual o homem e Deus compartilham a ciência, isto é, o conhecimento da vontade de Deus, aí é que resisto mais à substituição do velho “exame de consciência” pela “revisão de vida”. Não que este termo seja inadequado, pois a Igreja o utiliza largamente, mas porque penso que examinar a própria consciência é encontrar-se com o Deus Vivo e partilhar com Ele a vivência de sua Vontade na nossa vida. Tudo o que não corresponder a esta vontade deve ser banido, desenraizado do meu ser, independentemente de já ter sido expresso como pecado em pensamentos, palavras, atos ou omissões.
Cabe aos formadores - dos pais e professores ao formador comunitário e pessoal – o papel imprescindível de formar a consciência dos seus filhos e formandos. Isso é: ensinar-lhes a moral da Igreja, ajudá-los a distinguir entre o que é bem e o que é mal aos olhos de Deus e a levar sua vontade ao pleno cumprimento em uma profunda coerência entre sua vida interior e exterior. Quando a consciência não é bem formada, as pessoas sequer “enxergam” o que é pecado e raiz de pecado em sua vida.

Há, porém, o lado positivo da consciência, frequentemente esquecido: é aí, neste “lugar de encontro com Deus” que podemos conhecer sem subterfúgios a sua Vontade. Daí é que brota a misteriosa graça que nos faz dizer “sim” aos desejos de santidade de Deus a nosso respeito. É aí que encontramos a motivação mais íntima e a mais forte convicção para mudarmos de vida.
O “exame de consciência” deveria, assim, ser, para todos nós, fonte de grande alegria. Entretanto, comumente, fugimos dele. A causa mais plausível parece ser o medo. Medo de “ter que mudar”, medo de “ver como sou ruim”, medo de ser julgado e condenado.
O medo de “ter que mudar” não tem fundamento. Deus respeita tão profundamente nossa liberdade que, segundo Santo Agostinho, “deixou-nos livres até para ofendê-lo, embora tenha negado a Si mesmo a liberdade de não nos perdoar”. O mero fato de fazermos o exame de consciência fará brotar em nós a força do Espírito não só para mudar, como para desejar mudar. Sendo nossa consciência um lugar em comum entre Deus e nós, a visita em oração constante e honesta a este “lugar” nos encaminhará necessariamente para a verdade e a santidade.
O medo de “ver como sou ruim” está ligado ao medo de ser julgado e condenado. Sobre isso, ouvi certa vez do Moysés uma exortação que mudaria inteiramente minha forma de examinar minha consciência e me preparar para a confissão. Dizia ele em uma pregação: “Ao perscrutar sua consciência você o está fazendo juntamente com o Deus de Misericórdia, conduzido pelo Espírito Santo. Você estará diante da Misericórdia, que acolhe, perdoa, e que já pagou o preço do seu pecado. Você não estará diante de um juiz, mas de um Pai misericordioso que entregou seu Filho único por amor a você. Você estará diante do Filho que amou você a ponto de entregar-se. Não se coloque diante de você mesmo como juiz, pois não é você que irá julgar a si mesmo. Ao fazer isso, você acabará por encontrar justificativa para seus pecados com medo de sua própria condenação. Não se coloque diante de um homem, pois o sacerdote não irá julgá-lo, mas ministrar o perdão e a misericórdia de Deus. Com humildade, verdade e sem justificativas, coloque-se diante do Amor Misericordioso de Deus que através do sacramento da Reconciliação o perdoará inteiramente e recomeçará com você um novo caminho de amizade”. Quem teria medo diante deste Deus que não julga segundo a justiça, mas segundo a Misericórdia?
Ao longo da nossa vida espiritual, compreendemos que acolhemos tão mais perfeita e profundamente o perdão de Deus quanto mais perfeita e profunda forem em nós a humildade e a confiança. O Espírito Santo as infunde em nós e nos leva a, juntamente com Jesus, perscrutar nossa consciência e nos deixarmos perdoar sem medo e sem justificativas, com a simplicidade de uma criança que, conduzida pela Mãe, joga-se sem medo nos braços abertos do Pai.

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por Maria Emmir Nogueira, Co-fundadora da Comunidade Shalom
Revista Shalom Maná

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